Crônica – Ângela Monteiro

DE FLORES, AROMAS E CORES.

Naquela tarde de primavera, a lagoa da Pampulha era um espelho dourado refletindo a luz do sol. E os jardins de Burle Marx e Ceschiatti na Igreja de São Francisco de Assis – obra-prima do conjunto arquitetônico modernista -, me pareceram mais lindos do que nunca.

O carro da noiva estacionou em frente à porta da icônica igrejinha projetada pela genialidade de Oscar Niemeyer – a pedido de JK, quando prefeito de Belo Horizonte.

Gosto de simbolismos e tradições, e naquele momento fui invadida por uma alegria ao mesmo tempo suave e vibrante, me sentindo bem aventurada e bonita naquele rito de passagem.

Os sorrisos afetuosos me envolveram enquanto eu era conduzida pela nave, ladeada pelos painéis da Via Sacra de Cândido Portinari, em direção ao altar da capela.

Se fosse listar os momentos mais importantes e doces da minha vida, certamente o ¨dia da noiva¨ estaria no meu “top 10”.

Indo à igreja, borrifei-me com o “Ô” da Lancôme, fragrância que usei ainda por muitos anos. Ela traz notas olfativas de casca de laranja, flor de laranjeira e nelori (óleo essencial originado da decantação da flor de laranjeira).

O frescor de notas cítricas é meu preferido para os perfumes e, acompanhando esse gosto, naquele dia usei uma gloriosa grinalda de flores de laranjeira.

Nas mãos, levei um bouquet natural das mesmas flores que perfumou suavemente toda a abóboda sagrada naquela tarde.

A natureza tem seu tempo. Quando já estamos cansados dos dias quentes do verão, o outono nos traz uma temperatura amena, um sol mais tímido. Em seguida, o inverno nos dá o prazer de beber aquele chocolate quentinho, o aconchego dos agasalhos e cobertores.

Mas isto também nos cansa e o tempo, sempre fiel ao ciclo da divina força criadora, se transforma de mansinho e vai enfeitando nossos dias com o colorido e perfume das flores primaveris, trazendo o canto dos sabiás- laranjeira, bem-te-vis e sanhaços, que desfilam novas plumagens. É o renascimento da natureza.

Hoje, em nome da segurança e praticidade da vida moderna, quase todos nós moramos em prédios e condomínios de apartamentos.

 

As casas de antes tinham jardins e quintais floridos e na primara estes espaços eram coloridos por bougainvilleas, orquídeas, gérberas, girrasóis, frésias, copos de leite, lírios brancos, margaridas e rosas, muitas rosas, de todos os tons – especialmente as vermelhas, símbolo do amor romântico e das paixões.

Eu me lembro do meu avô materno colhendo grandes rosas e dálias no jardim da sua casa para decorar as jarras das salas. Uma louvação à alegria que a primavera nos traz.

Existem casas com jardins mundialmente famosos que se tornaram museus.

Exemplos são os jardins do impressionista Monet, em Giverny, na Alta Normandia, e a Casa Azul Mexicana da arte surrealista de Frida Kalo, que inspiraram tesouros da pintura.

E lá certamente existem muitas outras espécies da floricultura, além das que habitam nossos jardins e que esbanjam tons e perfumes na primavera.

A beleza das formas, cores e aromas da natureza em festa são emocionantes, seja onde for que se encontrem.

Muitos pintores nacionais se inspiraram na natureza e criaram quadros florais consagrados, como é o caso dos mineiros Bracher e Guignard e do baiano Di Cavalcanti.

Não é à toa que a Art Nouveau, movimento de arte característico dos anos de 1890 a 1905 se inspirou nas formas e cores das plantas e flores, além de explorar com detalhes atraentes o irresistível universo feminino.

Admiradores da Belle Époque podem apreciar o Museu Art Nouveau em Paris, criado por Pierre Cardin em 2004, no prédio do Restaurante Maxim’s.

As grandes árvores também se enfeitam na primavera. A nossa “Cidade Jardim” tem as copas dos flamboyants cobertas pelas cores laranja, amarelo e vermelho. Os Ipês alternam tons de branco, rosa, roxo e o amarelo ouro. Uma paleta exuberante de nuances cobrindo e encantando as avenidas e praças da cidade!

Em breve veremos o amanhecer da primavera austral do nosso hemisfério sul. É o retorno de Perséfone, Deusa das plantas, das sementes e das flores, segundo a mitologia grega.

As abelhas se enxameiam, formando novas colônias, e acontece o reflorescimento de várias espécies de plantas.

Após um período de recolhimento, a natureza vai renascer em beleza e harmonia, festejando a chegada das flores, aromas e cores.

A nova estação vem como bálsamo perfumado para nosso corpo e nossa alma, o que merece uma convocação.

Vamos fazer do novo ciclo das flores de 2020 a Primavera da Esperança!

(Ângela Monteiro, advogada)

 

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