Claude-Henri Gorceix: um diamante lapidado em Minas

Claude-Henri Gorceix: um diamante lapidado em Minas

Por CLAUDIA CAMPOLINA

Fundador da Escola de Minas de Ouro Preto, a história do mineralogista francês Claude-Henri Gorceix não se resume apenas nesse incrível feito para a educação e o desenvolvimento do Brasil. Nascido em Saint-Denis-des-Murs, no ano de 1842, estudou na École Normale Supérieure, onde foi aluno de Pasteur e adquiriu uma sólida formação em matemática, física e química. Em 1866, recebeu o título de Bacharel em Física e Matemática.

Depois de graduado, fez estágio na Escola Francesa de Atenas, onde estudou vulcanismo, adquirindo boa base de conhecimento geológico. Aos 34 anos de idade, por indicação de Auguste Daubrée e convite de Dom Pedro II, inaugurava, na cidade de Ouro Preto, Minas Gerais, a Escola de Minas, cujo regulamento baseava-se no modelo da Escola de Minas de Paris e de Saint Étienne. Representava, na época, uma revolução para o país, em se tratando de práticas pedagógicas educacionais.

Incluía ideias inéditas para o Brasil do século XIX: concurso de admissão, tempo integral para professores e alunos, ano letivo de dez meses, seguidos de mais dois de trabalhos práticos, boa remuneração dos professores, ensino gratuito, bolsas de estudo, e ainda prêmios de viagens ao exterior para os melhores alunos.

Corpo docente

Não menos importante foi a escolha do corpo docente daquela instituição de ensino. Num primeiro momento, foram convidados franceses formados na École Polytechnique e na École des Mines de Paris. Entre eles: Armand de Bovet, Arthur Thiré e Paul Ferrand. Alguns brasileiros também compuseram o quadro de professores, e, aos poucos, ex-alunos foram sendo incorporados como mestres.

A filosofia de ensino e as práticas pedagógicas nela implantadas foram responsáveis pela formação de renomados geólogos, mineralogistas e engenheiros metalúrgicos e civis que se espalharam pelo país, impulsionando o desenvolvimento siderúrgico brasileiro e contribuindo incisivamente para a formulação de uma política mineral desenvolvimentista.

As práticas educativas da Escola de Minas podiam ser resumida em alguns pontos: ênfase no mérito pessoal, no trabalho duro, na criatividade, na pesquisa de campo e de laboratório e, finalmente, na preocupação com a aplicação prática da pesquisa em benefício do desenvolvimento econômico do país, sobretudo no que se referia à mineração e à siderurgia.

Mudança de mentalidade

Para Claude-Henri Gorceix, o principal inimigo a combater era a tradição livresca, baseada na memorização de textos, enraizada no ensino brasileiro daquela época. Não havia praticamente ensino de ciências nas escolas secundárias brasileiras e mesmo em faculdades como a de Medicina era muito precário. O ensino brasileiro, nas palavras do insuspeito Rui Barbosa, formava um povo de “palradores e ideólogos”.

A ênfase na pesquisa ficou registrada no lema gravado no escudo da Escola: “Cum mente et malleo”, “com a mente e o martelo”. O geólogo norte-americano radicado no Brasil, Orville Derby, reconheceu a especificidade da Escola de Minas, que, segundo ele, conseguiu substituir o estudo dos livros pelo estudo da natureza.

Inicio da caminhada

Ao chegar ao Brasil, em 1874, aos 32 anos de idade, Claude-Henri Gorceix participou de uma viagem à diversificada base mineira do Rio Grande do Sul, acompanhado do cientista e diretor do Museu Nacional Ladislau Netto. Dava os primeiros passos para construir uma proposta sólida para a implantação da Escola de Minas, pois, através da busca e coleta de amostras geológicas do solo e minerais, conseguiu formar uma vasta coleção mineralógica que compôs o rico material didático da futura instituição de ensino.

É sabido que o projeto implantação da Escola de Minas previa a formação de geólogos e mineralogistas capazes de estudar o solo brasileiro a fim de aprimorar as explorações minerais e metalúrgicas no país. Devido a isso, a excursão de Gorceix não terminou no Rio Grande do Sul, pois para a instalação da Escola seria importante encontrar um local apropriado.

Gorceix encontrou esse local apropriado, na cidade de Ouro Preto, localizada na Província de Minas Gerais, uma região rica em recursos minerais, principalmente minérios com alto teor de ferro. Segundo ele: “Em muito pequena extensão de terreno, pode-se acompanhar a série quase completa das rochas metamórficas que constituem grande parte do território brasileiro e todos os arredores da cidade se prestam a excursões mineralógicas proveitosas e interessantes”.

Em seu primeiro momento, a Escola se instalou no Palácio dos Governadores e as aulas ocorriam em tempo integral, inclusive aos sábados e domingos, com a finalidade de formar engenheiros em um curto tempo. Gorceix foi o primeiro diretor, como também professor de mineralogia, geologia, física e química.

Gorceix na Exposição Universal de 1889

A exposição universal de 1889, que aconteceu, de 06 de maio a 31 de outubro, em Paris, não foi a primeira edição internacional em território francês, mas ficou famosa, dentre outras razões, pelo tema, que era a celebração do centenário da República, ou da Revolução francesa, e principalmente pela construção da Torre Eiffel.

Desde sua construção, a Torre Eiffel fascinou os parisienses causando muita polêmica. Ela era a entrada da exposição, que contava com outras instalações, como o imponente Palácio das indústrias, a galeria das máquinas, o palácio dos engenheiros e o Palácio das Belas Artes, além de um grande domo central e uma fonte. Deveria ser desmontada logo após o término do evento, mas felizmente seu construtor, Gustave Eiffel, conseguiu uma autorização para que ela permanecesse no Champs de Mars. Nesse espaço, também foi construído o Palácio do Trocadéro, demolido e substituído pelo “Palais de Chaillot”.

Foi nesse cenário deslumbrante que Claude–Henri Gorceix, em 1889, obteve a grande medalha por seus métodos de ensino e publicações científicas, e uma medalha de ouro por sua coleção mineral mineira . O Brasil foi um dos poucos países de regime monárquico – a última monarquia americana – a comparecer à festa republicana. Não o fez oficialmente, como representação de estado, mas através de uma delegação composta por empresários e jornalistas que formaram um Comitê Franco-Brasileiro.

As exposições universais ultrapassaram o objetivo inicial de disseminar os avanços da indústria, do comércio entre as nações, de um padrão de comportamento, e de impor uma pedagogia do progresso às massas. Representavam algo muito maior do que apenas feiras comerciais, a despeito de seu caráter industrial.

Eram antes salões de arte que privilegiavam as manifestações intelectuais, mais do que o comércio ou as atividades produtivas, o que se poderia constatar na própria premiação por meio de medalhas e honras, e não por valores em dinheiro. Nesse sentido, uma das principais abordagens sobre a participação de nações como o Brasil nas exposições universais refere-se ao descompasso com o centro evidenciado nas vitrines dos exportadores de matérias-primas.

Apesar disso, não podemos descartar que as riquezas minerais coletadas por Claude-Henri Gorceix e expostas no Pavilhão dedicado ao Brasil representavam o que de melhor o país tinha para oferecer em se tratando de comércio exterior naquela época. Deve-se lembrar também que que o papel de educador de Gorceix foi reconhecido internacionalmente, tendo sido premiado pelas ações realizadas na Escola de Minas

Mais uma vez, o mineralogista francês Claude-Henri Gorceix comprovou a sua importante atuação em prol da nação brasileira e demonstrou para os seus compatriotas franceses que o país latino-americano, o qual adotou como seu segundo lar, tinha muito a oferecer para o resto do mundo. Com certeza, a Nação verde amarela deve sua eterna gratidão a este espetacular educador, mineralogista, físico, que deixou seu rastro nos caminhos das Gerais.

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